O ensino privado no Brasil vem tornando-se objeto de mercado, e a lógica do capitalismo, ensejado na visão de alguns alunos como clientes, que se colocam numa condição de consumidores, subverte a ideologia de ensino de qualidade.
Estes alunos apresentam uma visão antagônica sobre o ensino e a instituição escolar: querem se formar numa instituição educacional reconhecida no mercado por sua qualidade e, ao mesmo tempo, que esta instituição lhes facilite a vida abrindo mão de suas presenças nas aulas, que os professores façam vistas grossas as “colas” durantes as provas e que, aceitem trabalhos entregues copiados da internet, entre outros.
Atitudes de alguns alunos, observadas em sala de aula:
• Acham que porque estão pagando mandam no esquema da aula, ditam como devem ser apresentados os trabalhos, as provas.
• Exigem seus direitos, como consumidores, mas não cumprem com seus deveres: o professor não pode chegar atrasado, ele, o aluno chega e sai da sala a hora que quiser; o professor tem que respeitar o aluno, enquanto o aluno, durante a aula conversa com os colegas, “lancha”, vende produtos, experimenta roupas, bijouterias, atende celular
• Atitude passiva: pagou pelo “produto” e quer que o diploma lhe seja entregue, sem o menor esforço. O professor é sempre o responsável se ele ficar com nota baixa e ser reprovado.
• Não assume responsabilidade pelos seus atos: estoura em faltas e, no final do semestre quer que o professor “de um jeitinho” e lhe dê presença, mesmo tendo faltado, sem apresentar atestado.
Ensino não é uma mercadoria, “um produto de prateleira” colocado à venda nas instituições de ensino. O nosso maior papel como educadores é formar, antes de tudo, cidadãos. O conceito de cidadania aplicado hoje em dia é amplo, mas existe uma definição básica: ser cidadão é ter o pleno conhecimento de nossos direitos e, também, de nossos deveres.
Uma professora que dá aula em três IES em São Paulo atribui a postura abusiva dos alunos não só ao fato de serem pagantes, mas a uma característica da geração: a falta de responsabilidade e de noção de limites.
Segundo ela “a palavra "cliente" carrega a idéia de passividade, objeto da ação dos outros. Quem vai ao dentista é um cliente que não pode em nada colaborar para que o seu trabalho fique bom. A quem compra um produto, só lhe resta conferir se está de acordo com as especificações. O aluno, não. Ele é o sujeito de sua educação, é o centro da escola, é o ator principal de uma grande epopéia. A escola oferece meios, prédios, equipamentos, biblioteca. O professor deve ter a consciência de que é apenas um facilitador, sua função cresceu em nobreza e, mais que nunca, é insubstituível.
A Professora Claudia Rizzo, da USP, na sua tese de doutorado escreve: “No meu modo de ver trata-se de uma ligeira falta de compreensão sobre pelo que se pagou. O aluno não comprou a instituição, nem o professor e não paga a mensalidade para fazer o que bem entende (e, diga-se de passagem, muitos desses "clientes" não fazem em casa ou no trabalho 10% do que fazem na instituição pois seriam escorraçados de pronto). Ele pagou por um serviço que será prestado por uma instituição autorizada para fazê-lo e que se submete periodicamente a avaliações diversas. Um curso não é algo tirado da cartola. Pessoas se reúnem para verificar que tipo de formação aqueles alunos precisam ter e têm a competência suficiente para determinar os rumos que a instituição e os cursos devem tomar. Para mim, o aluno sempre é bem-vindo para contribuir com sugestões, críticas e questionamentos que fazem com que o processo possa ser continuamente aprimorado. Mas entre isso e achar que tem total autoridade sobre o professor, sobre o conteúdo do curso, das aulas ou sobre a forma como esse professor conduz os trabalhos existe uma diferença abissal. Ou pelo menos deveria haver.”
Cláudia aponta que dentro da universidade o aluno pode ser considerado um “produto em transformação”, ou seja, ele entra na instituição como aluno, mas sai dela como profissional. Ao longo dos anos de estudo, receberá um treinamento que o transformará em um profissional. “Se a IES quiser oferecer ao mercado um profissional altamente qualificado, deverá cobrar desempenho do aluno. Por isso, dentro de sala de aula, ele não poderá ser considerado um cliente. E é dever do professor cobrar desempenho e dedicação do aluno, pois é por meio desse treinamento que ele vai se transformar em um bom profissional”, explica.
O aluno que se considera como cliente tem uma concepção equivocada do que é a educação, pois as instituições de ensino não vendem saber, ou competências.
O que nos anima, enquanto professores, é o fato de que nem todos, em sala de aula, se portam como cliente e sim como alunos e quando passam da condição de alunos para profissionais, bons profissionais, fazem nossa profissão valer a pena.
4 comentários:
Teus textos estão me lavando a alma. Às vezes, eu me culpava achando que exigia demais etc etc. Mas não é nada fácil, né amiga?
Bjkas, muitas e bom domingo!
Sei o quanto é dificil com a nossa estrutura governamental quase falida, ser um bom profissional ainda mais na sua área há que se ter o dom mesmo e muita dedicação e além disso ainda dedicar um espaço na midia pra nos trazer informações, só posso dizer aplausos de pé pela iniciativa e no que precisar eis aqui as minhas mãos. Bjus e muita sorte. Estou levando o selinho para os meus blogs.
Obrigada pelo carinho. òtima semana pra vc. Beijos....
Quando opta por tomar a condição de cliente, o aluno perde, antes de tudo, a própria constituição de ser humando em fase de adaptações. A questão vai além de comprar o produto que se vende. Passa por uma questão ainda mais complicada: ele "compra" o produto, mas não faz uso conforme especificado na "embalagem". Não estou falando do "agite antes de usar", tampouco me refiro ao "depois de abrir, consumir em três dias". Trato aqui da necessidade que o aluno tem de encontar alguém que "leia, abra e faça uso por ele mesmo", conferindo a outrem o que lhe cabe. Em outras palavras, ele espera que alguém o "carregue" dentro da faculdade. Não posso concordar com a parte em que a professora Claudia diz que "é obrigação do professor cobrar o desempenho do aluno...". Isso não cabe a ele. Sendo cliente ou tratando-se como aluno, cada um fará o uso e dará a destinação que melhor lhe convier. Posso não ser dos melhores, mas afirmo que meu papel na faculdade não é indicado por professores, nem mesmo é mostrado sobre o que pago. essa relação se dará de acordo com o que adoto por parâmetros profissionais. Meu papel é ditado por meu interesse, a cada vez que penso que cabe a mim, estender os estudos além das salas de aulas, além das experiências com os professores. A prática profisisonal se dará em situações específicas, onde não poderei contar com o auxílio dos professores ou de qualqeur outra pessoa. Em função disso, orientado por meus professores, cabe a mim, mostra a mim mesmo meu interesse pelos meus caminhos profissionais. A propósito (exceto pela relação conflituosa e frustrante que eles têm com os professores)não lamento sua existência, ou seu comprtamento de alheamento. Eu conto com esses alunos, para que num futuro bem próximo, eles não representem empecilhos ou dificuldades para que eu consiga meus objetivos.
Parabéns pelo texto,
Um abraço
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