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sábado, 2 de outubro de 2010

Cultura da paz!


Para falarmos de violência e não-violência, em um mundo cheio de conflitos e atos de violência e agressões, precisamos definir alguns conceitos e definir de onde estamos falando. Vamos falar um pouco da “cultura da paz”, um conceito que surgiu na ONU (Organização das Nações Unidas), e que nos ajuda a separar o jeito violento do não-violento de enfrentar os conflitos. De modo resumido, podemos identificar três dimensões da cultura da paz, de acordo com Marcelo Rezende Guimarães:

1. A primeira dimensão da cultura da paz destaca que a paz “possui a marca do humano”. Quer dizer, a paz, assim como a violência, se constrói e se aprende pelos seres humanos. As agressões ou guerras são ações humanas. Não fazem parte da natureza, mas da cultura.

2. A segunda dimensão da cultura da paz destaca sua enorme abrangência uma vez compreende todas as áreas da vida, desde o social, o político e o econômico, até as pequenas ações do cotidiano. Um bom exemplo é a educação: o diálogo e a não-violência foram importantes para mudar o jeito como a escola tratava a diversidade cultural e étnica.

3. Por fim, a cultura da paz não é uma situação já dada, nem atingida por decreto. Ela é um processo, uma construção social. Nesse processo de construir uma cultura da paz, os movimentos sociais reforçam um protagonismo especial: as mulheres, as minorias étnicas, a classe trabalhadora, os pobres de todo mundo, ou seja, grupos que sofrem violações de direitos humanos e que lutam contra elas são os construtores do avanço da cultura da paz.

Há muitas pessoas que falam de violência como se fosse uma força presente na natureza, como se crimes e agressões fossem fenômenos naturais ou parte natural da vida. Da mesma forma que a paz, a violência é uma criação do homem. Sem nenhuma regra fixa, a violência apresenta-se na sociedade de acordo com a arrumação social. Para enfrentar as injustiças, é preciso lutar. Mas lutar, no sentido comumente usado pelos movimentos sociais, não é ir à guerra, nem reagir com violência. Às vezes, a luta assume uma face agressiva, com o propósito de criar as condições para o diálogo. Só é possível haver diálogo quando existe uma relação de forças menos desigual.

A agressividade não se opõe à paz; pelo contrário, ela é necessária como forma de reação às injustiças. Nesse sentido, o contrário de agressividade é a passividade, o conformismo. Agressividade é entendida pelo pai da psicanálise, Freud, como uma força vital de cada pessoa, necessária para superar os obstáculos e as limitações próprias do cotidiano. A agressividade faz parte da natureza humana, assim como os conflitos.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) definiu a violência como: “O uso intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha grande probabilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação”.

Violência é qualquer ação que viola os direitos humanos. Pode ser física, psicológica ou moral. O povo brasileiro é comumente visto como cordial; no entanto, no Brasil os direitos humanos são aviltados, quase o tempo todo.

Hoje acontece um processo que é chamado de “banalização da violência”. A violência é tão comum, tão presente no dia-a-dia, que as pessoas não se incomodam mais com ela. Isso já é uma forma de violência contra as pessoas, que acabam se acostumando com uma situação insuportável. A violência e o crime nas grandes cidades são exemplos dessa banalização.

Uma área da psicologia diz que a agressividade faz parte da energia humana e que, dependendo da circunstância, pode se transformar em violência. A agressividade é como água, pode irrigar ou inundar, depende de como focamos essa energia; podemos usá-la para coisas boas, colhendo bons frutos, ou para coisas ruins, gerando a violência. A energia que faz um militante ir à rua para uma passeata é, muitas vezes, a mesma que faz outra pessoa quebrar um ônibus numa greve ou queimar pneus na rua, para impedir a passagem de carros. Como dissemos, os conflitos fazem parte do ser humano, mas podem ser violentos ou não-violentos, dependendo da atitude das pessoas.

Para resolver problemas, devemos ser agressivos, mas sem usar da agressão. Ser agressivo significa apresentar nosso ponto de vista, nossas opiniões e lutar pelo que acreditamos e pelo que defendemos, respeitando os princípios dos direitos humanos.

Nós somos muitas vezes educados para a violência, e precisamos reconhecer isso se queremos mudar nossa realidade. Não basta reagir à violência ou à cultura de violência, mas é preciso pensar como construir uma sociedade verdadeiramente pacifista e uma cultura de paz. A pró-atividade – uma atividade que se projeta para frente – incluiria, é claro, uma dimensão sanativa, de cuidar e atender às vítimas da violência, como também uma dimensão preventiva, privilegiando, especialmente, o caminho educativo. Para Gandhi, “A humanidade somente acabará com a violência através da não-violência”.

Uma das propostas quase sempre apontada como solução da violência nas cidades é o aumento das polícias. Essa é uma compreensão que a Roma Antiga tinha da paz – isto é, “Se queres a paz, prepara-te para a guerra” (Si vis pacem, para bellum). Entretanto, sabemos que a humanidade não avançará na prática dos direitos humanos apenas por decreto, ou por lei, muito menos apenas fortalecendo a polícia.

O fim da impunidade, por exemplo, é um passo mais importante para diminuir a
violência do que colocar mais polícia na rua.

Geralmente, violência e conflito são entendidos como a mesma coisa, mas existem diferenças importantes entre essas duas palavras. Como vimos antes, a violência é o modo como respondemos a uma determinada situação, prejudicando e anulando a outra pessoa, ou quando somos anulados e prejudicados por outra pessoa.

A violência não faz parte da natureza humana, mas é aprendida dentro de uma cultura violenta.

Quando pessoas, grupos ou nações apelam para a violência para acabar com seus conflitos, elas não estão “resolvendo” nada. Muitas vezes, os conflitos apenas pioram. Quando um dos lados é mais forte que o outro, uma das formas que esse lado se utiliza é de não reconhecer a existência de conflitos; negar a existência do conflito também é uma forma de violência. Quando o lado mais fraco se submete à imposição do lado mais forte, ele também alimenta a violência por não reagir à imposição autoritária do outro – isso é o que chamamos antes de passividade, que é diferente do pacifismo. Negar os conflitos não contribui para uma cultura de paz.

Construir uma cultura de paz exige que reconheçamos a existência de conflitos. Esse é o primeiro passo para resolver conflitos através do diálogo e de ações não-violentas. Quando você reconhece que o conflito existe, é o primeiro passo para ouvir o outro lado e começar um diálogo com respeito e igualdade.

Ser não-violento não é sinônimo do ser passivo, mas sim pacífico. Ser passivo é fechar os olhos diante de uma situação de injustiça, é aceitar a injustiça ao invés de assumir a responsabilidade de lutar contra ela. A passividade é causada, em geral, por medo das conseqüências do enfrentamento, ou por fraqueza de lutar pelas mudanças.

A não-violência nos direitos humanos é feita a partir da participação em um movimento organizado, articulado e estruturado. Isso leva as pessoas a se incluírem em uma luta mais ampla, da humanidade que busca a paz. A não-violência também se opõe à contra-violência, que é uma forma de reagir à violência com outros meios violentos.

Para usar a não-violência como estratégia de enfretamento dos conflitos, podemos usar três recursos: não-cooperação com as injustiças; intervenção nãoviolenta e divulgação dos direitos humanos.

No entanto, é preciso cuidados, pois uma determinada concepção da paz pode esconder o que justifica a violação dos direitos humanos, da pobreza, da miséria.

A violência não se exerce apenas por meio da agressão física ou armamentos, mas
também através de outras formas simbólicas, mas não menos perversas.

Fonte: Curso à distância: Direitos Humanos e Mediação de Conflitos.

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