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domingo, 26 de setembro de 2010

O que a educação tem a ver com direitos humanos?

Entender a educação como direito humano diz respeito a considerar que as pessoas se diferenciam dos outros seres vivos por uma característica única do ser humano: a habilidade de produzir conhecimento e, por meio dele, transformar, organizar-se e rever valores. Nesse sentido, fica claro que a educação tem um papel fundamental para criar uma cultura de respeito à vida e à dignidade humana, combatendo preconceitos e a discriminação.

A educação é um elemento fundamental para a transformação das pessoas e do mundo. É bom lembrar que nós não somos educados somente na escola: o ensino-aprendizagem começa ao nascer, e continua por toda a vida. Na convivência com as pessoas, vamos aprendendo e ensinando, de um jeito ou de outro. Pode ser na escola, na família, na comunidade, no trabalho, com amigos ou em muitos outros lugares vamos adquirindo e compartilhando conhecimentos. Usar desses conhecimentos para interagir com o local e buscar soluções dos problemas e das demandas sociais, é ir ao encontro de uma educação para os Direitos Humanos.

A escola não é o único espaço para a socialização dos conhecimentos, fazeres e saberes; entretanto, é uma parte fundamental para a educação formal das pessoas. As escolas deveriam ser a base não só de uma boa formação profissional, mas também para a formação de cidadãos mais conscientes de seus direitos e deveres.  Este espaço não pode se limitar à troca de saberes relacionados a ler e a escrever.

A escola é um espaço de conflitos e os conflitos nos dão a oportunidade para mudança: ajudam as pessoas a ensinar, aprender e a crescer. A educação, tanto formal quanto a informal, é uma estratégia fundamental para o avanço dos direitos humanos:
- Nos espaços de Educação Formal, não podemos cair no equívoco de tratar apenas das habilidades técnicas; assim como na educação profissional, esta não deve tratar apenas das ferramentas que contribuam tecnicamente com o profissional (médico, costureira, enfermeiro, professor, advogado, pedreiro), mas também de como estes devem/podem se comportar para que seus conhecimentos contribuam com uma sociedade, tendo por base os princípios da equidade.

- Os espaços de Educação Informal no geral já possuem uma ideia bem mais ampla que a educação escolar (ou formal). Os trabalhos são realizados fora do ambiente das escolas e ajudam as pessoas a se educarem. Portanto, educação informal inclui alfabetização, profissionalização, mas também as diversas outras formas de trocas de saberes e fazeres.

Não é possível refazer este País, democratizá-lo, humanizá-lo, torná-lo sério, com adolescentes brincando de matar gente, ofendendo a vida, destruindo o sonho, inviabilizando o amor. Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda. Se a nossa opção é progressista, se estamos a favor da vida e não da morte, da equidade e não da injustiça, do direito e não do arbítrio, da convivência com o diferente e não de sua negação, não temos outro caminho senão viver plenamente a nossa opção. Encarná-la, diminuindo assim a distância entre o que dizemos e o que fazemos...
(FREIRE, Paulo. Educação e mudança. RJ: Paz e Terra, 1979.)

Para pensar na educação que queremos, tomaremos como base a ideia da equidade: grande parte da população brasileira é pobre, enquanto uma minoria é riquíssima. O Brasil é um dos países mais desiguais do mundo, ou seja, a diferença entre os mais ricos e os mais pobres é uma das maiores do mundo. Assim, fica explícito que falta justiça social em nosso país. É preciso lutar para acabar com as desigualdades que perduram no modelo educacional brasileiro, tradicionalmente marcado pela negação da alteridade, que apaga as diferenças e suprime a existência do outro.

Existem dois grandes problemas que demarcam a desigualdade na atual educação brasileira: em primeiro lugar, há uma situação histórica de exclusão e marginalização das populações afrodescendentes e indígenas (e não apenas na escola, é bom lembrar); quadro este que reforçou ainda mais a situação de exclusão e marginalização. Não se passa impunemente por quinhentos anos de analfabetismo:

O Brasil chegou à independência sem projeto educacional capaz de superar as fissuras da deculturação jesuítica que, via catequese nas tabas, prefixara o “caminho da salvação” pela propagação da fé, negação do corpo e expiação dos pecados. De instrumento para civilizar os bárbaros, a “escola” passou a ser espaço de “inclusão” das populações residuais da nossa história, sob a tutela do Estado. De lá para cá, confinado à mera transmissão de conteúdos, exames e outras exigências inibidoras da aventura de ler e conhecer o mundo, esse modelo oco “quem não reproduz é reprovado” fez da escola um espaço “desinteressante”! (Santos, 2007)

Outro problema, esse bem mais recente, é a qualidade da educação pública.
Hoje, quase todas as crianças brasileiras em idade escolar (a partir dos seis anos, conforme LDB) estão matriculadas na escola. Mas em muitos casos, esses espaços não acrescentam nenhum saber a essas crianças, o que contribui para aumentar as desigualdades.

Ao longo da história, a educação brasileira foi sendo construída negando a diversidade: as culturas africanas e indígenas eram apagadas e apenas a “verdade” que vinha das escolas europeias tinha validade. Durante os três primeiros séculos de história de nosso país, foram trazidos para cá como escravos mais de três milhões de africanos. Foi a força do trabalho dessa população que gerou as riquezas que hoje formam o patrimônio das atuais elites econômicas brasileiras. E a pessoa escravizada ficou proibida de frequentar a escola. Eis um problema institucional que se reflete ainda hoje: mesmo depois da “abolição da escravatura”, não houve nenhuma ação do Estado para apoiar os escravizados e os seus descendentes.

Essa é a história retomada atualmente quando discutimos o tema das cotas nas universidades públicas. Estas cotas fazem parte das chamadas políticas compensatórias, reservando uma parte das vagas para serem preenchidas pela população que descendem dos africanos escravizados e dos indígenas e, em determinados casos, para os estudantes que vieram das escolas públicas. O debate sobre cotas toma diversos rumos, mas há um fato que vale a pena ressaltar – é uma medida no combate histórico das desigualdades na educação da sociedade brasileira no ensino superior público.

OBS: Texto referente curso Direitos Humanos e Mediação de Conflitos - à distância 

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