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sábado, 25 de setembro de 2010

DESIGUALDADE SOCIAL - Ralei Pereira Matos

Para a maioria das pessoas, a realidade social é assunto muito complicado, simples motivo para que não se lance nenhum olhar (nem mesmo de reprovação) às discrepâncias sociais que cercam a sociedade. Dessa forma, a desigualdade que dela provém, com objetos e fenômenos próprios, é algo que ainda não desperta a devida preocupação. Exceto quando dela se tira algum proveito.

As desigualdades sociais surgem, obrigatoriamente, no mundo do trabalho, onde se enfrentam os extremos antagônicos, que se voltam para interesses completamente distintos. Afirmamos ainda que elas se estendem e se ampliam quando o assistencialismo se traveste de políticas públicas, voltando-se à demandas setoriais, especificas, paliativas e de progressiva dependência.

É justamente pela falta de conscientização política, pela isenção com que se trata da questão social, pela nulidade na unidade social, que se permite que a desigualdade social se instale e se perpetue.

Falando sobre o que seja desigualdade social, há que se pensar que essa questão abrange quesitos mais amplos, tais como: raça - na diferenciação entre brancos e negros; gênero - quando o homem se sobrepõe à mulher e vice-versa; orientação sexual – quando a sexualidade é fator preponderante na formação do ser, ou de sua exclusão; religião – quando se percebe que diferenças de credo orientam a formação social e suas políticas; posições ideo-políticas – quando pensamentos e políticas públicas são voltados para currais eleitorais e vínculos partidários, ou sob a mesma, há a supressão destes, etc. Assim, é obrigatório dizer que todos esses fatores convergem para um único destino: o surgimento e o reforço da desigualdade social.

Analisando o que dissemos acima, percebemos que a desigualdade social surge já no “descobrimento” do Brasil, quando seus nativos se vêem espoliados em seus patrimônios (artísticos, culturais, políticos, sociais, e, a seu modo, econômicos). O histórico dessa invasão nos permite afirmar que essa desapropriação gerou uma condição de subjugação e dependência que nos caracteriza ainda hoje.

Isso posto, temos que a dominação ideológica é fundamental para encobrir o caráter dominante e alienador que se instala no Brasil e em todo mundo, com o que é o cerne da desigualdade social: o capitalismo.
                        
Baseamos nossa afirmativa na análise dos trechos a seguir:

“A história das sociedades, cuja estrutura produtiva baseia-se na apropriação privada dos meios de produção, pode ser descrita como a história das lutas de classes”. (1)

Essa afirmativa nos reporta à subalternidade da classe não portadora dos meios de produção que, acuada e sem conscientização política, deixa-se cair na não representatividade, acreditando-se mera co-adjuvante nos meios de produção capitalista. Aqui se dá o início da polarização social, com efeito favorável aos capitalistas.

“A crítica feita pelo marxismo, à propriedade privada dos meios de produção, dirige-se, antes de tudo, às suas consequências: a exploração da classe de produtores não possuidores, por parte de uma classe de proprietários, a limitação à liberdade e às potencialidades dos primeiros e à desumanização de que ambos são vítimas. Mas o domínio dos possuidores dos meio de produção não se restringe à esfera produtiva: a classe que detém o poder material é também a potência política e espiritual dominante”. (2)
                     
Percebe-se aqui o jogo tendencioso que desfavorece as massas, uma vez que, deixando-se subjugar, encontram-se vitimizadas pela opressão, pela imposição histórica de situações degradantes e constrangedoras, e, num conjugamento de forças, que vai do instinto de conservação ao ímpeto de destruição quando se submetem entre si mesmos dentro de seus círculos. Além disso, há que se considerar a dominação coercitiva que vai dos meios políticos, ao controle irrestrito da fé, que, não fugindo à regra épica, se torna objeto de mercantilização e pólo centralizador do poderio.

“Os regulamentos das corporações medievais opunham forte resistência à transformação do mestre em capitalista, ao limitar, por meio de rigorosos editos, o número máximo de oficiais e aprendizes que tinha o direito de empregar, e ao proibir-lhe a utilização de oficias em qualquer outro ofício que não fosse o seu. Além disso, era permitido aos comerciantes comprar qualquer tipo de mercadorias, menos a força de trabalho, uma vez que, para transformá-la em capital, o possuidor de dinheiro precisava encontrar no mercado o trabalhador livre, desde um duplo ponto de vista: primeiro, (...) tem que ser uma pessoa livre, que disponha (...) de sua força de trabalho como (...) sua própria mercadoria; segundo, tem que estar livre de todo, por completo, não deve ter outra mercadoria para vender (...)”. (2)

“Os meios de produção e de troca, sobre cuja base a burguesia se formou, foram criados na sociedade feudal. Ao alcançar um certo grau de desenvolvimento, esses meios de produção e de troca, as condições em que a sociedade feudal produzia e trocava, toda a organização feudal de agricultura e da indústria, em uma palavra, as relações feudais de propriedade, deixaram de corresponder às forças produtivas já desenvolvidas. Freavam a produção em lugar de impulsioná-la. Era preciso romper essas travas, e elas foram rompidas. Em seu lugar estabeleceu-se a livre concorrência, com uma constituição social e política, aliada à dominação econômica e política da classe burguesa”. (2)

Nessas assertivas, encontramos o princípio da concorrência, que no universo capitalista, é o fator principal para o desprezo do ser, uma vez que o mesmo passa a ser visto como detentor de capacidade laborativa, mas não de consumo. Podemos afirmar, sem brecha para erros, que a classe trabalhadora não conquista sua “liberdade” senão para ser estimulada ao consumismo desenfreado, para que alimente o capitalismo, sendo bombardeado por aquilo que ele ainda não conhece, tampouco tem necessidade. Essa é a lógica que mantém viva uma engrenagem social: o capitalismo, que além de ser o vetor desencadeante das desigualdades, é a base estruturadora das sociedades, nas quais ele se dá. Além disso, é também a condição propícia para que seu detentor atraia para si, a capacidade dominadora em todas as esferas, que vai do poderio econômico, passa pelas decisões políticas e culmina na dominação religiosa.

Essa dominação se dá a partir da detenção dos meios de produção, que deságua na concentração de renda, e, para sua manutenção, vive do oferecimento de baixos salários e más condições de trabalho, que culminam no desemprego, fome, mortalidade, marginalidade, violência e tantas outras expressões que fomentam, evidenciam, mantém a desigualdade social. A partir daí, é que se instalam também as outras formas de dominação, todas elas originadas da econômica, quer seja a cultural, a ideológica, a política e toda forma de cerceamento ao que poderia prover as condições de cidadania.

São essas condições que permitem o surgimento da estratificação social, (produzida também pela estratificação profissional), o que, num pensamento lógico, contribui consideravelmente para as desigualdades.

Ora, quando o ser não tem acesso aos meios de escolarização, àquilo que poderia favorecer seus expoentes, ao que lhe poderia evidenciar sua capacidade intelectual e laborativa, é claro que ele estará à margem do que seja o processo de produção.

Isso o levará a vender sua força de trabalho a título de sobrevivência. Recebendo seu salário, que é o preço de sua força de trabalho, ele está em atividade subordinada à classe capitalista.

É por isso que ele se sujeita, conseqüentemente, a ser o “beneficiário” de políticas estatais, que são a forma mais elaborada para atenuar os efeitos negativos do capitalismo sobre a população:
Essas políticas, esses serviços, públicos ou privados, devem ser encarados como a devolução à classe trabalhadora, do produto por ela criado, mas não apropriado, sob uma nova roupagem: a de serviços ou benefícios sociais.

Porém, vistos assim, aparecem como sendo coisas doadas ou fornecidos ao trabalhador pelo poder político, como expressão da face humanitária do estado ou de uma empresa privada.
                        
Voltando ao início do texto, afirmamos que tal pensamento se dá em função do alheamento, da pouca importância que se dá, e da falta de politização brasileira. Enquanto alguns se preocupam com questões fúteis, há aqueles que se aproveitam disso. É nessa relação que se criam as camadas sociais, e, dentro dessas camadas, a polarização, os guetos, regidos por estatutos particulares: onde ser homem ou mulher, velho ou jovem, branco ou negro, heterossexual ou homossexual, representante deste ou daquele partido, daquela ou daquela religião, tal ou qual cidade ou bairro, é que são fatores determinantes da inserção ou exclusão social.
                        
É nessas desigualdades que os “agentes coletivos” e não apenas os “agentes políticos” devem intervir, com a consciência das possibilidades de enfrentamento do que seja a questão social e suas expressões.
                        
O capitalismo reforça a má distribuição de renda e é o fator causal, desencadeante, mantenedor e agravante das desigualdades sociais. Logicamente é por suas dinâmicas e contradições que ele, aliado ao Estado, busca legitimação através de uma pseudodemocracia, atuando junto às demandas das classes subalternas, fazendo com que aí, incidam políticas que teoricamente devem se ajustar às necessidades da população. Surgem então os desmandos, os abusos, os desvios e as condições propícias para o estabelecimento da dependência de programas que existem tão somente para promover “doações” daquilo que na verdade deveria ser obrigatoriedade do Estado, em franco combate às disparidades provocadas pelo capitalismo.
                        
Essas disparidades se refletem especialmente sobre a qualidade de vida da população, interferindo na expectativa de vida, contribuindo para a mortalidade infantil, o analfabetismo, enfim, o declínio social.
                        
As desigualdades são frutos das relações sociais, políticas, culturais e, mais sensivelmente, das relações econômicas impostas pelo capitalismo. Elas se constituem de um misto de todos esses fatores e são promovidas à sua máxima potência, quando da isenção do Estado, que se assume impotente, para não dizer inoperante, onde deveria ser sua atuação, ou se limitando a projetos e programas que simplesmente atenuam as desigualdades sociais, quando se voltam à condicionalidades.
                        
Essas condicionalidades podem se traduzir na presença do estado mínimo, que aumenta ainda mais as disparidades sociais, reforça a dependência econômica, e não promove o ser, em detrimento de condições propícias e adequadas à implementação de programas de desenvolvimento, políticas de bem estar social, organização e administração de serviços.  Dessa forma, encontramos o pensamento dado por Montaño (2009: 80): “a atenção à pobreza, (...) é mais uma ação de conter as sublevações sociais e não uma das formas dos serviços estatais assegurarem direitos aos mais espoliados (...). Vistas como inimigas pública da ordem, as massas empobrecidas são estrategicamente mantidas na exclusão, o que reforça sua impotência e desorganização. Com isto, o poder político dominante, além de impedir seu reconhecimento como classe e sua participação nos grupos institucionalizados, a mantém como alvo de promessa e demagogia populista”.

Pela lógica, encontraremos seres alienados, alijados dos poderes, conseqüentemente das decisões. Esse será o caminho para a exclusão social, raiz frondosa do que é a desigualdade social, fazendo com que o que era pobreza econômico-financeira se transforme em pobreza social e política.
                      
 CONCLUSÃO

“Proletários de todos os países, uni-vos”.

A desigualdade social, fruto de más políticas, de interesses escusos, de alheamento e desinteresse, nada mais é do que o reflexo dos seres com os quais ela se dá.
                        
Responsabilizar agentes púbicos pelo que é a sociedade brasileira, é, no mínimo, responsabilizarmos a nós mesmos. Tal responsabilidade nos recai pelo simples fato de também sermos agentes sociais. Em outras palavras, também somos responsáveis pelas desigualdades; se não pelo voto inconsciente e sem propósitos, será pela omissão e conivência silenciosa com que nos situamos face aos problemas sócio-institucionais.
                        
A desigualdade social também não passa apenas pelos tentáculos capitalistas, mas, ela se instala aí, quando nos deitamos às imposições do consumismo. Ela nasce de nossa indiferença, quando somos ingerentes com nosso poder de decisão, quando nos isentamos de nossas responsabilidades ou insistimos no “jeitinho” para driblar as leis ou contornar situações que poderiam nos desfavorecer.
                        
Assim, quando oferecemos respaldo à isenção do Estado, ou quando o favorecemos, dotando-o de um caráter social emergencial e sazonal, nós o qualificamos como provedor paternalista, confundindo o que seria seu papel e esquecendo-nos de qual seria nossa obrigação e sua obrigação. Dessa forma, a desigualdade social será aquilo que do estado nós o fizermos. De outra forma, ou se aceita o convite de Marx, ou se coloca a favor de uma máquina de destruir homens.


1- O Manifesto Comunista.
2- Um Toque de Clássicos.

Texto enviado, através de e-mail, por meu aluno: Ralei Pereira Matos - Aluno 4º Período Serviço Social - UNIPAC

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito expressiva e genuína visão da atual conjuntura no que tange o desenvolvimento social.A falência múltipla de órgãos é o o retrato dessa realidade ignota, meramente assistencialista.

Boa Ralei.

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