Analisar a resiliência especificamente no desenvolvimento infanto-juvenil revela-se importante, pois existem fatores de proteção que podem reduzir impacto do estresse na infância, ajudando a prognosticar resultados positivos.
Segundo Papalia et al (2006, p.430), “crianças resilientes são aquelas que resistem a situações adversas, funcionam bem a despeito de desafios ou de ameaças ou recuperam-se de eventos traumáticos que teriam impacto altamente negativo no desenvolvimento emocional da maioria das crianças”.
Alguns estudos demonstram existir características específicas para crianças e adolescentes com personalidades resilientes desenvolvidas. Dentre elas destacamos: bom funcionamento intelectual, auto-estima, talentos, fé, relacionamento próximo com figura parental carinhosa, criação respeitável, laços com adultos pró-sociais fora da família, etc.
Baseados em tais afirmações, entendemos que a resiliência é uma excelente defesa psicológica contra as agressões impostas pela sociedade contemporânea. Santos (citada por MELILLO, 2005, p.92) esclarece que os problemas da sociedade atual dificultam e impedem a satisfação das necessidades básicas e colocam o sujeito, com freqüência, em situações de deterioração e isolamento, com a sensação de impotência para enfrentá-los e tentar resolvê-los. A sociedade é percebida como um lugar cada vez mais inóspito, o “outro” pode ser visto como um inimigo potencial e os laços de desconfiança se instalam nas relações sociais (...).
O mundo contemporâneo incita-nos constantemente à competição. Discutem-se as condições de um indivíduo por meio das suas aprovações em avaliações ou sua capacidade de produção. As lutas pela sobrevivência nesse contexto, em nosso entendimento, são grandes adversidades a serem superadas.
A resiliência pode então funcionar, nesses casos, como um auxílio no enfrentamento ou como uma defesa psíquica, principalmente nos casos de fracasso. Um indivíduo com alto nível dessa habilidade parece ser mais capaz de erguer-se psicológica e emocionalmente após resultados de insucesso que, costumeiramente, verificamos ocorrer. Ao mesmo tempo em que acreditamos na resiliência como uma defesa, entendemos que não se deve confundi-la com insensibilidade ou conformismo ou, ainda, com resignação. A resiliência é mais ampla, e propõe uma situação de positividade, ou melhor, de fortalecimento após a luta, o sofrimento e o desgaste. Ela instiga o ser humano a ser mais capaz, a elevar sua auto-estima, podendo, dessa forma, contagiar o grupo e a sociedade nos quais se insere.
No contexto escolar, percebemos que o adolescente tem condições para realizar uma avaliação sobre si mesmo e sobre o mundo no qual está inserido. Observa-se facilmente, dentro da escola, o grande número de jovens questionadores. Professores, por vezes, demonstram surpresa com determinados comportamentos que a juventude contemporânea apresenta. A rebeldia infanto-juvenil pode, inclusive, significar uma vontade de mudança nos papéis aprendidos anteriormente, o que demonstra a visão crítica que o jovem pode ter sobre si mesmo.
Na adolescência, o indivíduo já conta com o pensamento formal que lhe permite refletir, analisar e tirar suas próprias conclusões. Por tudo isso, esta é um etapa oportuna para fortalecer o desenvolvimento e acentuar habilidades psicológicas. Estudar as relações entre adolescência, educação e o conceito de resiliência mostra-se, então, importante e significativo.
A adolescência é uma etapa de transformações, contínua mudança e rápido desenvolvimento, durante a qual se adquirem novas capacidades. Dias, Cruz e Danish (2001, p. 158) acrescentam que “a adolescência é a altura mais apropriada para ensinar competências de vida”. Os adolescentes enfrentam complexos conjuntos de novos papéis e, simultaneamente, precisam rejeitar ou modificar papéis já adquiridos.
Argumentamos ser oportuno utilizar o ambiente escolar para estimular o desenvolvimento da resiliência, bem como para promover a saúde em crianças e adolescentes. De acordo com Benard (citado por MELILLO; OJEDA, 2005), pesquisas mostram que as escolas que estabelecem altas expectativas para todos os seus alunos e as que lhes oferecem apoio para alcançá-las – sendo esse apoio entendido como um fator de resiliência – são as que têm altos índices de sucesso na tarefa pedagógica. Tais escolas também melhoram os índices de comportamento problemático como o abandono dos estudos, o uso de drogas e a gravidez precoce.
Brunelle-Joiner (citado por PEREIRA, 2001) esclarece que pesquisas realizadas na Universidade da Flórida comprovam que os estudantes com características de resiliência progridem com mais facilidade nos seus estudos acadêmicos. Tais argumentos ressaltam a importância do papel da instituição escolar na promoção da resiliência e, conseqüentemente, da saúde dos estudantes, pois essa habilidade parece mostrar-se como um elemento de conservação da estrutura psíquica do sujeito.
Gonzalez Rey (1997, p. 275-288) acrescenta, em relação à possibilidade da escola atuar como instituição promotora de saúde, que: uma das instituições comprometidas com a promoção de saúde é a própria escola, considerando a promoção não apenas como a abertura de um conjunto de possibilidades de receitas saudáveis para o desenvolvimento da saúde, mas também como a reorganização dos sistemas de comunicação na instituição, de tal forma que o aluno se insira em sistemas de diálogo que favoreçam sua legitimação e bem estar. Promover saúde é antes de tudo educar um modo de vida diferente, no qual as atividades desenvolvidas pelo sujeito estejam comprometidas com seu desenvolvimento e bem estar.
Tais pontos de vista – e aqui nos referimos, mais especificamente, à inserção em sistemas de diálogo proposta pelo autor – referem-se à qualidade da socialização no ambiente escolar. Isso nos sugere reflexões acerca da socialização do adolescente e do aprendizado de habilidades e/ou competências para resolução de conflitos.
É importante ensinar certas competências aos adolescentes, de forma que possam exercer mais controle e equilíbrio em sua vida. Esse entendimento, contudo, gera novas dúvidas a respeito do ensino da resiliência por meio das adversidades escolares. Os alunos saberiam transferir as próprias avaliações do sucesso e/ou fracasso vivenciados no enfrentamento de uma adversidade mais simples, no caso da escola, para um enfrentamento mais complexo, seja ainda na própria escola ou até mesmo em sua vida adulta?
Observamos que intervenções que só mostrem os perigos – adversidades – não são suficientes e podem ser ignoradas. Entendemos que o adolescente necessita ser apoiado em seu processo de percepção.
Parece ser necessária uma intervenção direta do professor na transferência dos ambientes, isto é, o educador precisa apoiar o aluno em seu sucesso e discutir com ele o fracasso, mostrando que é possível aprender com a experiência. A intenção é um melhor enfrentamento em outras situações adversas diferentes e em outros ambientes, na escola ou na vida.
A resiliência é adquirida pela educação e pela experiência das dificuldades ultrapassadas, desenvolvendo-se a partir das relações que a criança estabelece com o meio (PEREIRA, 2001).
Face ao exposto, o papel do professor é fundamental. Nossa prática docente no contexto escolar do Ensino Fundamental e Médio de nossa escola nos mostra que as relações de amizade e confiança entre educador e educando, quando preservadas, podem ser de grande valia para o desenvolvimento do aluno.
Com base neste posicionamento, entendemos que o processo de educação e motivação dos adolescentes liga-se, diretamente, à confiança atribuída ao mestre. Dessa forma, torna-se mais importante a figura desse profissional na mediação das relações que as crianças e os adolescentes estabelecem com o mundo e com os outros. Nesse sentido, recorremos às contribuições de, Vygotsky. O aprendizado humano carrega uma essência social e histórica específica, em um processo por meio do qual as crianças parecem adentrar na vida daqueles que a cercam.
Segundo Oliveira (1995, p.57), estudiosa da obra, de Vygotsky, o aprendizado é o processo pelo qual o indivíduo adquire informações, habilidades, atitudes, valores etc. É um processo que se diferencia dos fatores inatos (...) Em Vygotsky, justamente por sua ênfase nos processos sócio-históricos, a idéia de aprendizado inclui a, interdependência dos indivíduos envolvidos no processo (...)
O ser humano cresce num ambiente social e a interação com outras pessoas é essencial ao seu desenvolvimento. Vemos aqui a relevância dos mediadores da aprendizagem. A intervenção de outras pessoas – que, no caso da escola, são os professores e/ou as demais crianças – mostra-se fundamental para o bom desenvolvimento do indivíduo.
Entendemos que a função do professor transcende a simples transmissão de conhecimento. Na condição de educador, deve buscar auxiliar a criança para a vida, contribuindo, por esse meio, para questões mais amplas, auxiliando-a na construção da própria identidade. O educador contribui para a realização dos estudantes como seres humanos, preparando-os para superarem os desafios apresentados pela vida. Isso consiste em colaborar com os processos do desenvolvimento psicológico do aluno e exigir atenção, concentração e coragem frente às crises surgidas.
O professor deve utilizar-se do contexto escolar para o desenvolvimento de valores e competências no adolescente. Contudo, compreender o que é necessário para que as competências se transfiram de um meio para outro, bem como sua adaptação no novo contexto, parece ser uma capacidade crítica individual, ou seja, uma outra habilidade que deve existir no indivíduo e que precisa ser ensinada.
Se o objetivo do educador é ensinar valores por meio de adversidades escolares, faz-se necessário discutir como esses valores se transferem para outros ambientes ou outras situações. Percebemos, assim, que o professor tem papel destacado, no sentido de estabelecer diálogos acerca de tal transferência. Consideramos, portanto, que esse profissional pode favorecer a promoção de fatores de resiliência em adolescentes na escola.
Grotberg (2005) relaciona vários desses fatores, divididos em categorias e dentre elas destacamos duas: (1) “eu tenho” pessoas que me mostram, por meio de sua conduta, a maneira correta de proceder, pessoas que querem que eu aprenda a me desenvolver sozinho; e (2) “eu posso” encontrar alguém que me ajude quando necessito. Se o jovem tem um bom professor e pode sempre encontrá-lo, fica explícita a importância de seu papel.
Acreditamos que a comunicação das positivas experiências em aula e na escola se estabelece em diversos níveis. Entendemos que o professor e outros membros da escola podem e devem fazer com que o aluno acredite em sua total possibilidade de alcançar êxito. Em nosso cotidiano escolar, utilizamo-nos de tais métodos, isto é, incentivamos os jovens a perceberem suas potencialidades, suas habilidades, bem como suas fraquezas.
Naturalmente, relações de sinceridade e autenticidade geram confiança entre indivíduos. Assim – e diante de tais argumentos referentes às adversidades do contexto escolar como as constantes mudanças de ambientes, as novas amizades e inimizades em novas séries escolares, as dificuldades com relacionamentos afetivos, o namoro, as provas e avaliações, os resultados e notas, as interações com os professores ou outros membros da instituição, as práticas esportivas e corporais na Educação Física – reiteramos que a escola se apresenta como um ambiente favorável, senão excelente, para o desenvolvimento da resiliência.
Considerações finais:
As adversidades estão inseridas na vida humana e as descobertas sobre resiliência parecem indicar caminhos para um desenvolvimento mais positivo diante dos enfrentamentos das dificuldades. Pelo fato de propor um estado de fortalecimento individual, de melhora após o embate, a resiliência pressupõe uma inovação em relação ao desenvolvimento humano. Um pensamento sobre quebra de paradigmas na abordagem dos problemas humanos, sem demasiado apego a limitações, desvios, bloqueios ou carências do indivíduo, mas sim atentando para as possibilidades de continuidade, de progressão, de promoção de saúde mental.
A resiliência já se apresenta, no contexto escolar, como uma habilidade psicológica muito importante e que merece ser incentivada, sendo um processo de adaptação aplicável ao desenvolvimento em ambientes favoráveis ou adversos.
Tendo abordado a relevância da resiliência na escola, sugerimos a expansão do estudo desse fenômeno para o contexto específico das disciplinas escolares. Acreditamos que, se incorporado à escola de forma apropriada, o conceito desta habilidade pode contribuir para a formação do adolescente, preparando-o para as muitas adversidades que, certamente, precisará enfrentar em sua vida futura.
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